A FUNÇÃO SOCIAL DA ARTE
Luis Alberto Afonso
A arte não parte de uma definição abstrata, lógica
ou teórica do seu próprio conceito, mas se vale de atribuições feitas por
instrumentos de nossa cultura, dando certa dignidade aos objetos sobre os cai
ela recai. Assim uma peça que pôde ser classificada como arte séculos atrás
pode agora não sê-lo. Como aquelas que também mantêm seu valor artístico
e ainda não sabemos descobrir o que delas nos apanha ou nos envolve.
O fato de possuir a arte um mundo com novos
significados para o homem, significados afastados do real, faz com que o homem
na procura de um mundo mais justo e mais compreensível fique perto dela. O
homem quer ser mais do que apenas ele mesmo. Quer ser um homem total, ansiando
uma “plenitude” de vida que lhe é burlada pela individualidade e todas as suas
limitações. O homem anseia por absorver o mundo que o circunda, quer integrá-lo
a si, quer unir na arte o seu “ EU” limitado, com uma existência humana
coletiva e por tornar social a sua individualidade.
A arte é meio indispensável para a união do
indivíduo como um todo, reflete a infinita capacidade humana para a associação,
para a circulação de experiências e idéias. O próprio Ernest Fischer faz
questão de se perguntar se essa definição de arte não é um pouco romântica.
Aqui poderíamos nos deter numa análise transversal do fato na construção da
obra artística e o prazer que dita obra já concluída produz. O homem quando
produz uma obra de arte, o faz de uma forma altamente consciente e racional e
não de modo algum atravessando um estado embriagante ou afastado da realidade.
Para conseguir ser um artista, é necessário, dominar, controlar e transformar,
a experiência em memória, a memória em expressão, a matéria em forma.
Por esta razão o processo seguinte da apreciação da
arte não pode ser o de completa abstração do ser humano, mantendo esse elemento
“dionisíaco” de elevação e afastamento da realidade.
Ela não pode
ser também divertimento e satisfação com o qual o espectador não se identifica e até se distancia do que está sendo apresentado?
As contradições dialéticas são inerentes à arte,
pois ela não só precisa derivar de uma intensa experiência da realidade, como
também precisa ser construída, precisa tomar forma através da subjetividade.
Durante a apreciação de uma obra de arte, os laços da
vida são temporariamente desfeitos, pois a arte cativa diferente da realidade,
e este agradável e passageiro cativar
artístico, constitui precisamente a natureza do divertimento, a natureza daquele prazer que encontramos até nos
trabalhos trágicos.
Se analisarmos Bertolt Brecht, no seu teatro
militante, veremos nele a sua dialética, intrínseca na arte do fazer teatral,
pois o homem deve ir ao teatro não só para se divertir ou para se elevar, mas
para refletir frente aquilo que está assistindo. Deve, por um processo
orgânico,nascer nele uma Natureza Crítica, capaz de se confrontar com o que
está vendo e se perguntar como essa situação pode ser mudada e chegar a
desenvolver um senso de opinião e de luta.
Carl Marx, nos seus análises, enxergou que na arte,
historicamente condicionada por um estágio social não desenvolvido, perdurava um momento de humanidade, e nisso Marx
reconheceu o poder da arte de se sobrepor ao momento histórico e exercer um
fascínio permanente. A razão de ser da arte nunca permanece inteiramente a
mesma.
A função da arte, numa sociedade em que a luta de
classes se aguça, difere ,em muitos aspectos, da função original da arte. No
entanto, a despeito das situações sociais diferentes, há uma coisa na arte que
expressa uma verdade permanente. E é essa coisa, que nos possibilita ficar
comovidos com as pinturas pré-históricas das cavernas e com antigas e velhas
canções.
É verdade que a função essencial da arte para uma
classe destinada a transformar o mundo não é a de fazer mágica, e sim a de
esclarecer e incitar à ação, mas é
igualmente verdade que um resíduo mágico na arte não pode ser inteiramente
eliminado, já que sem este resíduo, que surge da natureza original a arte,
deixa de ser arte. A arte é necessária para que o homem se torne capaz de
conhecer e mudar o mundo. Mas a arte também é necessária em virtude da magia
que lhe é inerente.
A FUNÇÃO SOCIAL DO
TEATRO
Felipe Menezes
Antes de se falar sobre a função social do teatro é
preciso primeiramente apontar, identificar os problemas sociais. A arte por si
só tem sua função (responsabilidade) para com a sociedade, e cabe a própria
arte apontar os vários caminhos para efetivar esse encontro.
O teatro comercial tem a sua função para com o seu
público com seu discurso tomado de ideologias implícitas e explicitas, para com
seus consumidores de entretenimento. Em toda manifestação artística existe a
chamada função social. É preciso estar atento, manter UM OLHAR CRÍTICO sobre
sua realidade. Teatro é uma ação política – logo isso significa dizer que toda
ação em teatro implica numa reação (à)
política.
Busca-se uma mudança social através da visão
artística daqueles que fazem teatro. Essa mudança é processual, dependendo dos
diversos fatores externos e internos.
Devemos nos perguntar: qual publico queremos
atingir com nossas ações estética, éticas e políticas?
É preciso
estar indignado para se fazer teatro e estar amparado, conscientemente, da
provocação que queremos lançar.
Foi dito que o teatro é o Oasis, porém,
divergências nos impossibilitam de fecharmos respostas para perguntas como: o
que seria de fato, esse Oasis? Ou onde está esse Oasis?
Pontuamos em nossa discussão que “ conteúdos
libertadores tem o poder de transformar
os espectadores” em contraposição ao teatro digestivo ( é uma das inúmeras definições que Nelson Rodrigues
usava para criticar um tipo de produção espetacular onde o carro chefe era o
lucro e não o conteúdo do espetáculo) que tem em si um produto fechado, já
acabado onde se atualizam as piadas.
Numa tentativa ingênua, porém arriscada, a função
social do teatro é o desejo de provocar, causar pequenas REVOLUÇÕES individuais.
“Teatro não é um lugar de recreio irresponsável.
Não. É, antes, um pátio de expiação”. Nelson Rodrigues.
A FUNÇÃO SOCIAL DO
TEATRO
Roberto Alvim
Qual a
função do teatro hoje? Qual o seu papel dentro da nossa comunidade? O que se
espera dele, o que se espera ver quando se vai ao teatro?
Pensemos um pouco sobre isso (e pensar é
difícil...) usando o exemplo concreto no próximo parágrafo como trampolim.
Está em cartaz até o final de julho no teatro
Ziembinski (Rio) um espetáculo chamado BRASIL 2005 – 8 visões. Trata-se da
reunião de 8 peças curta escritas por dramaturgos contemporâneos retratando
suas visões da realidade brasileira. O texto abordou um aspecto do Brasil que
lhe pareceu interessante ( violência, política, vida na classe media, vida na classe alta, vida na classe baixa,
policia, juventude, cada autor escreveu um textinho de 25 minutos a respeito.
O projeto é uma tentativa de levar questões mais
urgentes para o nosso pais, para o nosso povo neste ano e discuti-las no palco.
Foi inspirado em outro projeto semelhante realizado em 1970 A FEIRA BRASILEIRA DE OPINIÃO. Nessa, 10
autores, fizeram o mesmo, falando então do perigo da ditadura militar, clamando
pela anistia dos presos políticos, pela abertura da redemocratização do Brasil
etc.
Quais são as diferenças entre os dois projetos,
isso pode nos ajudar a pensar sobre a
função social do teatro hoje?
Na época da ditadura, o Brasil não estava nos
jornais. A mídia impressa e televisiva não podia dizer o que estava
acontecendo, era censurada pelo governo militar.
Assim como o Teatro Oficina, o Teatro Opinião e o
Teatro de Arena exerciam uma resistência feroz e corajosa expondo em cena o
Brasil que a imprensa não podia divulgar. Teatro para se unir a essa atitude de
resistência, para ver a verdade, para ver a nação brasileira – que estava
apenas nos palcos, nos filmes, na MPB da época, mesmo disfarçada em metáforas de
fácil compreensão para todos - que estavam irmanados na mesma luta e soterrados
pela mesma repressão.
O povo brasileiro oprimido, o grito de liberdade, a
indignação, isso as pessoas só encontravam no teatro e os estudantes, a classe
média, os intelectuais, a inteligência brasileira da época toda lá, vendo
o Brasil que não podia ser visto em outros lugares, discutindo as coisas
que eram censuradas nos meios de comunicação de massa.
Hoje vivemos uma situação exatamente inversa. A
realidade brasileira está estampada todos os dias nos jornais. Nossos
políticos, nossa corrupção, nossa vida, nossa miséria, tudo está exposto em
fotos coloridas e manchetes garrafais. E todos nós, submetidos a uma
over-exposição permanente de Brasil, através de revistas, da TV, rádio, jornal
etc.
Pois bem, aí está talvez o que mais fortemente
diferencia a função social do teatro brasileiro contemporâneo do quer feito na
época da ditadura: nos anos 60/70 teatro para ver o Brasil não podia ser visto.
Hoje, não há mais censura e a imprensa expõe continuamente a realidade e as
questões do nosso pais, portanto, não se quer ir ao teatro para ver o Brasil!
As pessoas estão saturadas de polícos Jeffersons, de escândalos, de CPIs, de
violência urbana, de desigualdades.
Quando se vai ao teatro hoje, o que menos se quer é
se deparar com denúncias, discussões acerca de iniqüidades. Prefere-se ver
qualquer coisa: a relação mãe e filha na Suécia gelada de Ingmar Bergman, as músicas e as danças dos
famosos, musicais com A bela e a Fera
...Qualquer coisa, contanto que não seja o Brasil contemporâneo, esse Brasil
que vivemos e do qual estamos saturados.
Portanto,
caros amigos, se a função social do teatro no passado era engajar as pessoas
nos problemas sociais brasileiros, hoje, graça asa nossas circunstâncias
históricas, a função do teatro é proporcionar um escape, uma fuga (ainda que
por uma hora de espetáculo) dos problemas sociais brasileiros. E agora, José?